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Ácido fólico na gravidez
Imagem meramente ilustrativa (Banco de imagens: Shutterstock)

O uso de ácido fólico na gravidez é uma medida de eficácia comprovada na prevenção de malformações congênitas

Inúmeras vitaminas são essenciais para o desenvolvimento saudável do bebê e a manutenção da fisiologia materna. A maioria delas pode ser obtida através de uma alimentação e estilo de vida saudáveis, entretanto, é sabido que algumas vitaminas devam ser suplementadas na gravidez. Uma das mais estudadas é o ácido fólico, um precursor da vitamina B9. Nos últimos anos, o uso do ácido fólico na gravidez vem sendo questionado, sob a justificativa de que a melhor forma a ser administrada seria o metilfolato, sua forma ativa. Mas quais são as evidências científicas a respeito desse assunto? Nesse artigo esclareceremos os principais aspectos e discutiremos as principais polêmicas do uso do ácido fólico na gravidez.

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O que é o ácido fólico?

O ácido fólico é a forma sintética da vitamina B9, que após a ação de uma enzima chamada metilenotetrahidrofolato redutase (MTHFR), é transformada na sua forma ativa, o metilfolato. Os folatos estão presentes em alimentos como feijão, vegetais verde escuros, frutas cítricas, ovos, fígado, carnes e frutos do mar. Quando isolados do alimento, os folatos mostram-se instáveis, e rapidamente são degradados.

O ácido fólico tem a característica de ser muito mais estável em relação ao metilfolato para administração oral, ou para adição em farináceos. Questiona-se a utilidade do seu uso nos farináceos, pois sabe-se que em temperaturas maiores que 180 graus o ácido fólico começa a perder suas propriedades e, acima de 200 graus, é degradado.

O folato é fundamental para transformar um aminoácido chamado homocisteína em metionina. A metionina possui papel central na redução do risco de malformações do sistema nervoso central do bebê (como anencefalia e espinha bífida), além de reduzir o risco de abortamento, pré-eclâmpsia, prematuridade, baixo peso, dentre outras doenças. Para a gestante, é muito importante na prevenção de anemia.

Qual é a importância do ácido fólico na gravidez?

A suplementação de ácido fólico na gravidez representa um marco na história da Medicina Fetal. Ela representa uma das medidas preventivas de malformação fetal mais simples e eficazes. Através de uma vitamina de baixo custo, no Brasil disponível gratuitamente no SUS, conseguimos reduzir em 50% a 70% o risco de defeitos de fechamento do tubo neural, como a anencefalia e espinha bífida.

O ácido fólico na gravidez também é importante na prevenção de um tipo específico de anemia, a anemia megaloblástica. Embora a maior parte dos casos de anemia na gestação ocorram por deficiência de ferro, uma parte considerável dos casos pode ocorrer por deficiência de vitamina B12 ou de folato. Considerando que a anemia eleva o risco de parto prematuro e feto pequeno para idade gestacional, conforme publicado pelo Prof. Dr. Alan Hatanaka nas Recomendações SOGESP de 2022, sua suplementação associada a polivitamínicos mostra grande importância também para a mãe.

Além desses benefícios, também temos que considerar que o aporte adequado de folato reduz a chance de abortamento, pré-eclâmpsia, dentre outras doenças gestacionais. Embora a administração do ácido fólico na gravidez seja extremamente importante, não podemos esquecer que o folato e outras vitaminas e nutrientes podem ser obtidos por uma alimentação saudável. Assim, o uso da vitamina não deve substituir o estilo de vida saudável na gestação.

Quando começar a usar ácido fólico na gravidez?

Com relação ao tempo de uso do ácido fólico na gravidez, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, o CDC, toda mulher que planeja engravidar deve iniciar o uso de ácido fólico na dose de 400 a 800 mcg, pelo menos um mês antes da concepção.

Embora não exista dúvidas do benefício do ácido fólico na gravidez, a porcentagem de mulheres que fazem uso correto da vitamina é extremamente baixa no Brasil. Dados nacionais mostram que 62% das mulheres referem ter tido pelo menos uma gestação não planejada, com maior percentual entre as mulheres que utilizam o sistema público de saúde (65%), em relação ao sistema privado (55%).

Dr. Alan Hatanaka

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Devo utilizar ácido fólico ou metilfolato?

Antes de discutirmos qual tipo de folato a mulher deve utilizar, é essencial melhorar nossa assistência de planejamento familiar. Não é admissível que 62% das mulheres brasileiras não planejem a gestação e, portanto, não utilizem ácido fólico ou não realizem uma consulta pré-concepcional. Essa consulta é a única maneira de prevenir inúmeros problemas para a gestante e seu bebê.

A discussão da melhor forma de folato a ser administrada tem fundamentação farmacodinâmica e genética, mas tentarei ser simples na explicação. O ácido fólico, que é administrado em comprimidos ou enriquecem os farináceos, antes de sua ação, deve ser transformado em metilfolato por uma enzima chamada MTHFR. Algumas mulheres possuem uma mutação genética que causa deficiência dessa enzima. Isso irá ocasionar redução na conversão do ácido fólico em metilfolato, a forma ativa da vitamina B9, que converte a homocisteína em metionina. Poucas linhas acima, expliquei a importância da metionina.

É inegável que exista uma vantagem teórica no uso do metilfolato em comparação ao ácido fólico, entretanto, é fundamental comprovar na prática que o uso do metilfolato oral gere a mesma dose e o mesmo efeito do ácido fólico. Foram realizados estudos de equiparação de doses e de efeitos sobre a quantidade de homocisteína após o uso do metilfolato em comparação ao ácido fólico, e não foram achadas diferenças entre as drogas. Ressalta-se, que também não foi encontrada superioridade para nenhuma das drogas.

O próximo passo seria comprovar a eficácia na redução do risco de anencefalia e espinha bífida, como há com o uso de ácido fólico na gravidez. Quando pesquisamos os termos “methylfolate” e “neural tube defects” no Pubmed, verificamos que não existem estudos que comprovem, na prática, que o uso do metilfolato reduza o risco de defeitos de fechamento do tubo neural. Intrigado com essa informação, pesquisei em outras fontes confiáveis, como sites de sociedades internacionais, como a norte americana, canadense, australiana, inglesa, europeia e no Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, o CDC, não encontrando dados sobre tal pesquisa.

Obtendo os mesmos resultados que a minha pesquisa, o CDC dos Estados Unidos colocou um posicionamento em seu site, que irei traduzir a seguir e pode ser encontrado no endereço:

https://www.cdc.gov/ncbddd/folicacid/mthfr-gene-and-folic-acid.html

“O ácido fólico é o único tipo de folato que comprovadamente ajuda a prevenir defeitos do tubo neural. Você pode ter ouvido ou lido que se tiver uma variante MTHFR C677T, você deve tomar outros tipos de folato (como o metilfolato), mas isso não é verdade. O ácido fólico é o único tipo de folato que comprovadamente ajuda a prevenir defeitos do tubo neural (defeitos congênitos graves do cérebro ou da coluna). Não existem estudos científicos que demonstrem que suplementos contendo outros tipos de folato (como o metilfolato) possam ajudar a prevenir defeitos do tubo neural.”

Há efeitos colaterais?

Em geral, a suplementação de ácido fólico na gravidez é bem tolerada e, na prática diária, observamos raras mulheres com sintomas que sequer são relatados na bula como cefaleia e algumas alergias na pele.

São relatados pelas indústrias farmacêuticas:

  • Náuseas;
  • Vômitos;
  • Retenção de gases;
  • Distensão abdominal;
  • Reações alérgicas com prurido (coceira), vermelhidão ou urticária.

Ácido fólico causa autismo?

O ácido fólico na gravidez não causa transtorno do espectro autista!

Em 2019, importante revisão sistemática (forma de evidência científica mais forte que existe) publicada na revista Nutrients, demonstrou que o uso de ácido fólico (e não metilfolato) associado a multivitamínicos, reduz em cerca de 36% o risco de transtorno do espectro autista. Em 2021, nova revisão sistemática foi publicada na revista Journal of Autism and Developmental Disorders, demonstrando que o uso de ácido fólico isolado (e não metilfolato), reduz o risco de transtorno do espectro autista em cerca de 30%.

Em 2023, outra revisão sistemática foi publicada na revista JAMA (revista com fator de impacto de 56,27 pontos) reafirmando os benefícios do uso do ácido fólico na gravidez, chamando a atenção para importância de iniciar a prevenção pelo menos 4 semanas antes da concepção. Esse estudo é concordante com as publicações prévias, que demonstram que não há nenhuma relação do uso do ácido fólico e o aumento da incidência de transtorno do espectro autista.

As evidências aqui expostas tornam a tentativa de associação do uso do ácido fólico na gravidez e o transtorno do espectro autista, por qualquer profissional de saúde, atitude irresponsável e inaceitável.

O uso do ácido fólico é apenas um dos pontos que são abordados durante uma consulta pré-concepcional. Prevenir intercorrências na gestação envolve iniciar antes da concepção a adoção de um estilo de vida saudável, suplementação vitamínica correta e racional, tratamento de infecções e de doenças clínicas.

A equipe do Prof. Dr. Alan Hatanaka está à disposição para acolher sua família.

 

Fontes:

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