Os probióticos são micro-organismos que potencialmente podem ser benéficos na gravidez, mas só podem ser utilizados em condições específicas para que sejam seguros
A gravidez é um período de profundas transformações no organismo feminino, incluindo alterações significativas na microbiota intestinal e vaginal 1–4. Os probióticos, definidos como micro-organismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem benefícios à saúde do hospedeiro, têm ganhado destaque na comunidade científica por seu potencial impacto durante a gestação5,6.
É fundamental compreender que os probióticos diferem entre si pelo tipo (Lactobacillus, Bifidobacterium, etc), se é combinado com mais de um probiótico ou com prebióticos (prebióticos, basicamente, constituem no alimento do probiótico), no tipo do veículo (pó, comprimido, oral, vaginal, etc) e na quantidade (a maioria dos probióticos existentes não possui a quantidade adequada de probióticos).
Mas será que o uso de probióticos na gravidez é realmente indicado e seguro para todas as gestantes?
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Benefícios dos probióticos na gravidez
Influência nas infecções maternas
A suplementação com probióticos tem sido estudada na prevenção e tratamento de infecções urogenitais 7–9. Os resultados indicam que probióticos podem ser benéficos no tratamento da vaginose bacteriana e da candidíase7–9. No entanto, os trabalhos foram realizados fora do período concepcional, o que gera dúvidas se o uso dos probióticos na gravidez são seguros e eficazes.
No período pós-parto, a utilização de probióticos mostrou redução do risco de mastite puerperal em cerca de 49%. Importante ressaltar que os trabalhos usaram Lactobacillus Salivarius 1 bilhão de cepas por dia, de 30 semanas até o nascimento, ou Lactobacillus fermentum, 3 bilhões de cepas, durante a amamentação 10.
Diabetes gestacional
Embora inicialmente se acreditasse que os probióticos na gravidez poderiam reduzir o risco de diabetes gestacional, estudos recentes não evidenciaram benefícios significativos nesse aspecto11.
Prevenção do parto prematuro
Alterações na microbiota vaginal estão relacionadas ao aumento do risco de parto prematuro1,12–14. Entretanto, os estudos que investigaram o uso de probióticos na gravidez para prevenção do nascimento prematuro não demonstraram benefício significativo 11,15.
Saúde do recém-nascido
A administração de Lactobacillus rhamnosus após 36 semanas de gestação, continuada durante a amamentação e estendida ao recém-nascido, mostrou eficácia na prevenção de dermatite atópica em crianças com predisposição a alergias 16. É fundamental ressaltar que o estudo foi feito iniciando seu uso apenas após 36 semanas. O uso de probiótico durante toda a gestação não é recomendado e pode trazer riscos.
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Cuidados necessários com a suplementação de probióticos na gravidez
A manipulação adequada e a conservação correta de probióticos são essenciais para garantir a eficácia terapêutica e a segurança do uso de probióticos na gravidez. Como os probióticos contêm microrganismos vivos, eles requerem condições específicas de fabricação, armazenamento e transporte para manter sua viabilidade.
A Resolução RDC nº 67, de 8 de outubro de 2007, estabelece que é vedada a manipulação em farmácias de medicamentos que exijam condições especiais de produção, controle e armazenamento não disponíveis nessas instalações (Anexo I, item 5.2)17. Além disso, a produção de probióticos deve seguir as Boas Práticas de Fabricação (BPF) descritas na Resolução RDC nº 17, de 16 de abril de 2010, que detalha os requisitos para garantir a qualidade e a segurança dos medicamentos18.
É importante ressaltar que probióticos não podem ser produzidos em farmácias de manipulação, pois essas não dispõem das condições necessárias para garantir a qualidade e a segurança desses produtos. A RDC nº 718, de 1º de julho de 2022, determina que apenas medicamentos probióticos registrados na Anvisa e fabricados por estabelecimentos autorizados podem ser comercializados e utilizados no país (Artigo 3º)19. A manipulação inadequada pode levar à contaminação ou à perda de viabilidade dos microrganismos, o que representa um risco à saúde, ainda mais quando falamos de probióticos na gravidez 19.
Os riscos associados ao uso inadequado de probióticos na gravidez são ainda mais relevantes. Embora alguns estudos tenham investigado o uso de probióticos na prevenção de complicações gestacionais, uma revisão da Biblioteca Cochrane sobre o uso de probióticos na prevenção do diabetes gestacional não demonstrou benefícios significativos. Além disso, resultados secundários indicaram que o uso contínuo de probióticos na gravidez pode aumentar o risco de pré-eclâmpsia em 85% (Risco Relativo 1,85; IC 95% 1,04–3,29)11. Essa evidência foi considerada forte, pois todos os estudos apontaram para o mesmo resultado. A pré-eclâmpsia é uma das principais causas de mortalidade materna e pode também resultar em restrição de crescimento em óbito fetal.
Probióticos na gravidez: devo utilizar?
O uso de probióticos na gravidez deve ser restrito aos períodos com indicação precisa e, necessariamente com probióticos autorizados pela ANVISA, que não incluem os manipulados.
A indicação com maior evidência de funcionamento é para prevenção de dermatite atópica do recém-nascido. Seu uso deve ser iniciado ao redor de 36 semanas para famílias com antecedente de dermatite atópica, utilizando mais de 6 bilhões de cepas de Lactobacillus rhamnosus por dia, e mantendo o uso no período de lactação. O probiótico não deve ser utilizado a gestação toda, pois há aumento do risco de pré-eclâmpsia 11.
Deve-se lembrar que a melhor forma de manter uma microbiota saudável é através do estilo de vida saudável. Dieta balanceada, sono adequado, afastamento de estresse e exercícios físicos são fundamentais para a mãe e para o bebê, devendo ser iniciados antes mesmo da gestação20.
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